‘Rachadinhas’: 5ª Turma do STJ julga legais relatórios usados na investigação de Flávio Bolsonaro

Publicado em 17 de março de 2021

Por 3 votos a 2, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou legal, em julgamento nesta terça-feira (16), o compartilhamento com o Ministério Público do Rio de Janeiro dos relatórios produzidos pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) e usados nas investigações do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) no caso das chamadas “rachadinhas”.
A Quinta Turma rejeitou recurso da defesa de Flávio Bolsonaro, que apontou irregularidades na comunicação feita pelo Coaf sobre movimentações financeiras “atípicas” no gabinete do senador.
Com esse novo entendimento sobre o Coaf, os investigadores não precisam retomar o caso da estaca zero.
A decisão pode dar um novo fôlego às investigações. Isso porque no mês passado a Quinta Turma determinou a anulação das quebras de sigilo fiscal e bancário do senador, o que, na prática, invalidou a denúncia oferecida pelo Ministério Público.
O MP acusa Flávio Bolsonaro, um dos filhos do presidente Jair Bolsonaro, de envolvimento em um desvio de mais de R$ 6 milhões dos cofres da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) — a Procuradoria-Geral da República recorreu dessa decisão.
A maioria dos ministros da Quinta Turma seguiu o voto do relator, ministro Félix Fischer, e considerou legais os atos praticados pelo Coaf no compartilhamento com o MP do Rio.
“O Coaf não possui a relação de contas utilizadas, as pessoas que transacionaram com F [Flávio Bolsonaro]. O Coaf não tem relação de beneficiários de pagamentos e títulos no RIF [relatório de inteligência financeira]. Os Rifs gerados pela inteligência financeira vinculavam os dados que já constavam no repositório de informações. Não há comprovação de “fishing expedition” [busca de provas]”, argumentou Félix Fischer.
O ministro João Otávio de Noronha discordou do relator e afirmou que há indícios de uma conduta ilegal do Conselho no caso.
Para Noronha, foi promovida uma verdadeira “extensão de investigação” por via administrativa sem a necessária autorização judicial.
O ministro ressaltou que não estava questionando o fato de que o conselho possa compartilhar dados com órgãos de investigação, mas que o procedimento adotado no caso Flávio Bolsonaro não foi legal.
“Coaf não é órgão de investigação e muito menos de produção de prova. Tem de fazer o relatório de investigação e mandar, e não pode ser utilizado como auxiliar do Ministério Público”, afirmou o ministro.
O ministro Reynaldo da Fonseca acompanhou o voto do relator no sentido de que não houve ilegalidade no compartilhamento de dados do Coaf com o MP. Para o ministro, os dados fazem parte do chamado relatório de intercâmbio, que é permitido entre os órgãos de fiscalização e o MP.
“Os relatórios não indicam extratos bancários, indicam operações específicas relacionadas à investigação. Ora, o nível de detalhamento das informações no banco de dados do Coaf é definido com base na sua finalidade”, disse.
Fonseca afirmou que não verificou ilegalidade nos relatórios fornecidos pelo Coaf, sendo que o conselho não tem como informar apenas valores globais, podendo repassar data , horário, banco , agência e terminal utilizado de operações sob suspeita para permitir eventuais investigações necessárias.
“A função do MP é angariar elementos para subsidiar o fornecimento de eventual denúncia. O fato de o Coaf possuir informações a respeito da remuneração do agravante e participação acionária tem com o objetivo de aferir sua capacidade econômica e financeira”, afirmou.
A maioria foi formada com o voto do ministro Ribeiro Dantas, que também não viu ilegalidade na troca de dados do Coaf com o MP.
O ministro afirmou que, ao examinar o caso, o Tribunal de Justiça do Rio também apontou que não houve irregularidade no compartilhamento.
“O tribunal de origem [TJ-RJ] destacou desde o primeiro momento que este compartilhamento consignou não ter havido uma devassa indiscriminada na conta do paciente [Flávio Bolsonaro]”, afirmou.
O ministro Joel Ilan Paciornik acompanhou a divergência aberta por Noronha e considerou a atuação do MP e do Coaf nas apurações irregular.
“Os relatórios minuciosos vinculam dados protegidos por sigilos bancário e fiscal. Os autos mostram indícios de comunicações informais entre o Coaf e o MP, carentes de legalidade”, disse.

Denúncia
Em outubro, Flávio Bolsonaro e outras 16 pessoas foram denunciadas por peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
Segundo os investigadores, todos os elementos reunidos até agora comprovaram a “rachadinha” e como o senador teria usado o dinheiro desviado dos salários de assessores.
Com os dados obtidos na quebra de sigilo, o MP afirma:
• que Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro, fazia pagamentos de contas pessoais do senador e da família dele;
• que Flávio Bolsonaro usava a loja de chocolates da qual era sócio para receber recursos obtidos na “rachadinha” e depois retirava como se fosse lucro;
• e ainda que houve compra de imóveis usando dinheiro vivo em operações suspeitas.

Outro recurso rejeitado
A maioria da Quinta Turma também rejeitou nesta terça-feira um segundo recurso da defesa do senador, que pedia a declaração de nulidade das decisões da primeira instância no caso das rachadinhas, já que o Tribunal de Justiça do Rio reconheceu foro privilegiado para Flávio Bolsonaro, deputado na época dos fatos.
Os ministros entenderam que, como até aquele momento se avaliava que o caso deveria ser analisado pela primeira instância, não há irregularidade que justifique a anulação. A maioria seguiu o voto do ministro Felix Fischer.
Os ministros Fonseca e Ribeiro Dantas deixaram em aberto a possibilidade de o órgão especial do TJ ter que reavaliar esses atos, uma vez que é o foro competente.
Os ministros Noronha e Paciornik chegaram a defender que os atos da primeira instância ratificados pela Terceira Câmara do TJ do Rio fossem anulados e tivessem que passar por uma nova análise do órgão especial. Esse entendimento ficou vencido.
G1

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