Centros para adolescentes infratores são iguais a prisões’, diz CEDH-PB

Publicado em 5 de julho de 2015

igual“Os centros de educação da Paraíba, que deveriam agir para reeducar e ressocializar adolescentes que comentem infrações, são praticamente réplicas dos presídios que punem adultos”. Essa foi a constatação do padre João Bosco, membro do Conselho Estadual de Direitos Humanos da Paraíba (CEDH-PB), após inspeções nos Centros Educacionais paraibanos.
Parte dos motivos que fazem com que o conselheiro chegue a essa conclusão estão expostos em um relatório apresentado pelo conselho ao Ministério Público Federal (MPF) no dia 19 de junho. Além da superlotação observada no Centro Socioeducativo Edson Mota (CSE), também há registros de um porrete com os nomes ‘ECA’ e ‘Direitos Humanos’ gravado, usados para punir os adolescentes, que foi encontrado no Centro Educacional do Jovem (CEJ).
A lista de irregularidades ainda inclui agentes educacionais terceirizados de uma empresa de segurança particular, comida insalubre feita fora do centro socioeducativo, acomodação de adolescentes em celas semelhantes às de presídios e denúncias de agressões e punições análogas às aplicadas por agentes penitenciários. Os problemas, segundo João Bosco, são antigos e detectados em outros centros e demonstram que a infraestrutura não segue as diretrizes do Sistema Nacional Socioeducativo (Sinase).
O texto do relatório produzido evidencia que “a unidade se parece com um presídio. Os alojamentos são celas, com pouca ventilação e luminosidade. Algumas delas se parecem com ‘grutas’, conforme definição dada pelos próprios jovens. As paredes estão cheias de mofo e de pichações. Durante as inspeções havia restos de comidas para todo e qualquer canto. O único critério seguido para a separação dos jovens parece ser o das ‘facções’”.
“Se fala muito em reduzir a maioridade penal para punir os adolescentes como adultos, mas essa punição já acontece na prática nos centros socioeducativos. As próprias irregularidades encontradas pelo Conselho [Estadual de Direitos Humanos] comprovam que as práticas nos centros são semelhantes às dos presídios”, comentou o padre João Bosco.
Quem faz coro com o conselheiro é a juíza da Vara da Infância e da Juventudade da Paraíba, Antonieta Maroja, que avalia que os problemas nos centros educacionais de adolescentes em conflito com a lei são uma realidade nacional. Ela destaca que a maioria desses centros abrigam mais adolescentes do que a capacidade prevista. “A falta de condições para aplicação plena do que prevê o Estatuto da Criança e do Adolescente comprometem o trabalho de ressocialização dos adolescentes que cometem delitos”, avalia.
A magistrada é enfática ao comentar que não há impunidade quando se trata de adolescente infratores, uma vez que todos são punidos com medidas socioeducativas. Segundo ela, na Paraíba menos de 1% dos delitos que envolvem violência são cometidos por adolescentes, uma estatística semelhante ao cenário brasileiro.
“Os atos infracionais considerados graves, praticados com algum tipo de violência, cometidos na Paraíba não atingem nem a 1% do total desse tipo delito, assim como o percentual nacional. Os adolescentes são muito mais vítimas desse tipo de violência do que autores. Não podemos entender que um adolescente, que está em um processo de formação do caráter, seja inserido no sistema carcerário brasileiro no qual os presos são amontoados em presídios, onde as políticas de ressocialização são tímidas”, arremata.
Sobre as denúncias de irregularidades no CSE e no CEJ citadas no relatório divulgado pelo CEDH-PB nos dias 3 e 19 de junho, a presidenta da Fundação do Desenvolvimento da Criança e do Adolescente Alice de Almeida (Fundac), Sandra Marrocos, afirmou ao G1 que uma comissão interna de sindicância foi instaurada no dia 29 de junho para apurar as denúncias, mas que por enquanto a comissão está apenas realizando reuniões internas, e que só vai começar a atuar quando o CEDH-PB definir um representante para acompanhar as atividades da comissão.
Segundo Sandra, além da Diretoria Técnica, Diretoria Administrativa, Coordenação de Segurança, Ouvidoria e Assessoria Jurídica da Fundac, o órgão convidou um representante da Ouvidoria Geral do Estado e o padre Xavier Paolillo, representando o CEDH-PB. “Fizemos o convite, mas eles mandaram um ofício informando que não iriam participar”, disse.
Por telefone, o padre Xavier Paolillo informou ao G1 que não faz parte das funções do conselho acompanhar as atividades da comissão. “O conselho é um órgão fiscalizador. Nós fizemos todo o relatório e encaminhamos para o Ministério Público, que é quem deve participar da sindicância. Nós não temos como participar, a gente apenas acompanha, como membros externos, colaborando com os órgãos que são competentes a participar”, explicou.

Redução da maioridade penal
O padre João Bosco, que acompanha de perto o trabalho de ressocialização dos adolescentes e jovens infratores, comentou que a redução da maioridade é “um arma que a sociedade está apontando contra si”. Para ele, punir os adolescentes vai dificultar o trabalho de reeducação e prejudicar o contato da família com os jovens que cometem delitos.
“Se essa medida for adotada, toda essa meninada exposta ao crime será levada para unidades prisionais comuns, a família desses adolescentes será penalizada, ficará detida, sofrerá com as revistas, com o preconceito que existe. Esse trabalho com adolescentes será prejudicado”, completou.
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que reduz de 18 para 16 anos a idade penal para crimes hediondos, homicídio doloso e lesão corporal seguida de morte foi aprovada em primeiro turno pela Câmara dos Deputados na madrugada da quinta-feira (2), apenas 24 horas depois do plenário rejeitar a redução da maioridade para crimes graves. Para virar lei, o texto ainda precisa ser apreciado mais uma vez na Casa e, depois, ser votado em outros dois turnos no Senado.
Para a juiza Antonieta Maroja, o trabalho da família no processo de ressocialização dos adolescentes é fundamental. “No centro de ensino voltado apenas para atender meninas tudo funciona muito bem, temos a assistência familiar em conjunto com os trabalhos educacionais. Por isso que esse trabalho tem que ser feito em parceria. Políticas públicas e apoio familiar”, explicou a magistrada.

Punições começam aos 12 anos
Ainda de acordo com a juíza da infância e da juventude, a maioridade penal no Brasil é na verdade de 12 anos, que é a idade inicial em que se pode aplicar as medidas socioeducativas. O ideal, segundo Antonieta Maroja, não seria uma redução da maioridade penal, mas a flexibilização da idade máxima de permanência nos centro de ensino, atualmente de 21 anos.
“Pesquisas em políticas sociais indicam uma idade ideal de 28 anos incompletos, idade em que as pessoa ainda são consideras jovens. Com a idade limite atual, muitas vezes nós temos o processo reeducação interrompido porque a idade não permite uma continuidade do trabalho. A sociedade precisa saber que a pena existe e é a medida socioeducativa. As próprias pessoas que defendem a redução reconhecem que a mudança não resolveria a questão. O sistema educativo é muito mais eficaz que o penal, os números comprovam”, concluiu.
Paraiba1

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