Forças Armadas não são poder moderador, diz atual presidente do Superior Tribunal Militar. Vídeo
Publicado em 26 de setembro de 2023O ministro Joseli Camelo, que assumiu em agosto último a presidência do Superior Tribunal Militar (STM), disse que “Forças Armadas não são poder” e que é importante para a manutenção do Estado de direito que a decisão final em questões jurídicas seja do Supremo Tribunal Federal.
Questionado sobre o artigo 142 da Constituição Federal – invocado por bolsonaristas para afirmar que cabe às Forças Armadas moderar os poderes constitucionais –, ele afirmou que a garantia da lei e da ordem prevista pelo artigo não cabe apenas às Forças Armadas, e que a medida deve ser usada de forma excepcional, apenas em situações extremas.
“Não está na Constituição que nós [militares] temos de manter os poderes sob a nossa tutela, não está em lugar nenhum”, disse.
Ele disse ter sido procurado pelo deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP), relator de proposta de emenda constitucional (PEC) que quer modificar o artigo 142 da Constituição.
Foto: Reprodução/GloboNews
G1
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As Forças Armadas e o poder moderador
O artigo 142 da Constituição Federal de 1988 expressa claramente o papel das Forças Armadas em um Estado democrático de Direito.
A Marinha, o Exército e a Aeronáutica compõem aquelas forças e “são instituições nacionais permanentes e regulares (…) sob a autoridade suprema do presidente da República e destinam-se à defesa da pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”.
A despeito da clareza desse dispositivo constitucional, o Supremo Tribunal Federal já se posicionou sobre o tema, concedendo uma liminar em face de um pedido do PDT, a respeito de leis que definem qual seria o papel das forças armadas e, cujo julgamento de mérito será retomado pelo Plenário daquela corte no próximo mês.
As Forças Armadas são instituições permanentes, fazem parte do Estado e não têm qualquer relação com o governo, cuja essência é política e transitória e, tampouco, com todos os órgãos que o compõem e que estão sujeitos às mudanças governamentais.
O objetivo das Forças Armadas é de natureza militar e só entram em ação na hipótese de garantir a segurança da pátria, a garantia do livre exercício dos poderes públicos (Executivo, Legislativo e Judiciário) e, por ordem de um deles, garantir o cumprimento da lei e da ordem.
Sendo uma instituição destinada estritamente àquelas finalidades, não existe a menor possibilidade de as forças armadas exercerem o chamado “poder moderador” (ou quarto poder), no sentido de intervirem na seara de um dos poderes públicos quando ocorrer algum desequilíbrio institucional que possa ameaçar a sua harmonia e independência.
O poder moderador foi previsto durante o Império, na Constituição de 1824, e era exercido por dom Pedro 2º quando se fazia necessário harmonizar os poderes do Império e zelar pelo cumprimento da Constituição.
É importante observar que o poder moderador foi perdendo força progressivamente quando se criou, com o apoio de dom Pedro 2º, a presidência do Conselho de Ministros, que concedia maior autonomia ao Poder Executivo, com a criação do hoje denominado chefe do poder Executivo federal (presidente da República). Daí o Brasil se tornar, de certa forma, uma monarquia parlamentarista naquela época.
No entanto, o poder moderador constituía um poder exclusivamente “político”, apesar da sua finalidade precípua ser a de um “poder neutro”, para apaziguar as tensões entre dom Pedro 2º (o monarca) e as forças políticas republicanas liberais.
A despeito de as Constituições posteriores não mais preverem o poder moderador, até porque o sistema político é republicano, mesmo que ele existisse hoje, as suas raízes são de natureza política e não se coadunariam com a finalidade das Forças Armadas enquanto instituições permanentes do Estado e competentes, constitucionalmente, para a defesa da pátria, a garantia dos poderes públicos e a defesa da lei e da ordem, o que equivale a corroborar a sua essência exclusivamente militar e, portanto, voltada à garantia da segurança nacional.
Em ultima ratio, as Forças Armadas só poderiam intervir na possibilidade concreta e iminente de ameaça ao regime democrático brasileiro, o que se considera uma hipótese remota, diante do progressivo amadurecimento das suas instituições.
Nessa direção e igualmente distante da realidade, as Forças Armadas teriam de garantir a lei e a ordem quando um poder público estivesse usurpando o exercício dos demais poderes (tomando como pressuposto o esgotamento de outras alternativas de diálogo institucional), mediante grave ameaça ou violência, o que se considera fora de qualquer cogitação.
Mas, nesse caso, a intervenção seria, também, de caráter militar, para a garantia da ordem e segurança pública, e nunca de natureza política, como seria o papel de um poder moderador.
Essa é a grande diferença!
O poder moderador compunha o governo, cuja natureza é política! As Forças Armadas têm uma finalidade estritamente militar e apolítica!
Vera Chemim
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