Viagem de comitiva a Israel custou R$ 88 mil e não resultou em acordo por spray contra Covid

Publicado em 17 de maio de 2021

A viagem de uma comitiva organizada pelo governo a Israel, entre 7 e 9 de março, custou pelo menos R$ 88,2 mil e terminou sem a assinatura de um acordo de cooperação entre o Brasil e a empresa israelense que desenvolve um spray nasal para possível tratamento da Covid-19.
As informações estão em uma resposta, de 44 páginas, do Ministério das Relações Exteriores a questionamentos formulados pela bancada do PSOL na Câmara dos Deputados. Os dados foram divulgados pelo portal UOL e obtidos também pelo G1.
Consultada, a Secretaria de Comunicação da Presidência informou que o Palácio do Planalto não irá se manifestar.
A viagem dos parlamentares e funcionários do governo a Israel deve ser alvo de análise pela CPI da Covid no Senado.
Participaram da comitiva brasileira o ex-chanceler Ernesto Araújo; os deputados Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e Helio Lopes (PSL-RJ); o ex-secretário de Comunicação do governo Fabio Wajngarten; os assessores do Palácio do Planalto Filipe Martins e Max Moura; auxiliares do Itamaraty; e somente dois técnicos: Hélio Angotti Neto, secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação do Ministério da Saúde, e Marcelo Morales, secretário de Pesquisa e Formação Científica do Ministério da Ciência e Tecnologia.
De acordo com o documento do Itamaraty, do último dia 7, foram gastos US$ 14,2 mil, 1,6 mil euros e R$ 2,7 mil com passagens, alimentação, hospedagens, reserva de salas e diárias, entre outras despesas. Não estão contabilizados os custos com o deslocamento em avião da Força Aérea Brasileira (FAB).
Em relação ao spray nasal, a resposta do Ministério das Relações Exteriores diz que havia uma proposta de o Brasil integrar a fase 2 do desenvolvimento do medicamento (EXO-CD24), “fazendo parte de um ‘pool’ internacional”.
Essa aproximação, segundo o documento, poderia facilitar a aprovação da droga no Brasil, agilizando a importação, e a “eventual produção local”.
Entretanto, o ofício do Itamaraty diz que um acordo entre o Brasil e o fabricante não foi celebrado, por falta de assinatura de representante do Ministério da Saúde brasileiro.
“No que diz respeito à carta de intenções entre o Ministério das Relações Exteriores, o Ministério da Saúde e a OBCTCCD24 LTDA (empresa israelense) sobre cooperação em relação ao spray nasal EXO-CD24, cujo objetivo seria consolidar a intenção do governo brasileiro de dar continuidade ao diálogo sobre cooperação com aquela empresa, o projeto de carta não teve sua celebração completada, uma vez que não foi assinada pelo representante do Ministério da Saúde e não chegou à troca de instrumentos entre os signatários, conforme prática de negociação internacional”, diz trecho do documento do Itamaraty.
No dia 4 de março, o deputado Eduardo Bolsonaro postou em uma rede social que o medicamento teve “quase 100% de sucesso” após testes em “algumas dezenas de pacientes graves com Covid”.
Na mesma publicação, o parlamentar afirmou que a comitiva brasileira iria a Israel assinar um acordo de entendimento a fim de abrir caminho para aplicação e “quiçá até produção no Brasil”. A assinatura, conforme o Itamaraty, acabou não ocorrendo.
O spray também foi tema de conversa entre o presidente Jair Bolsonaro e apoiadores no Palácio da Alvorada, também em março.
O presidente disse na ocasião que as primeiras informações sobre a droga eram “as melhores possíveis”.
“Vamos ver se a gente consegue assinar o acordo e começar a aplicar na terceira fase no Brasil. E é para quem está em estado grave. Então, dificilmente, alguém vai, no meu entender, se opor a esse tratamento”, afirmou Bolsonaro.
O documento do Itamaraty enviado aos deputados do PSOL diz que o medicamento é uma “proteína em desenvolvimento para o combate ao câncer, mas [foi] aplicado no combate aos efeitos da Covid-19 em 30 pacientes, dos quais 29 mostraram melhora significativa após 2 dias de uso inalável do fármaco”.
Segundo o órgão, o remédio ainda aguarda autorização das autoridades sanitárias israelenses para realização da fase 2 de testes.
Indagado pelos deputados do PSOL, o Itamaraty afirmou que a viagem a Israel estava sendo planejada desde o segundo semestre de 2020, mas “sucessivamente adiada devido às persistentes e imprevisíveis dificuldades logísticas impostas pela pandemia”.
O ofício afirma ainda que a viagem a Israel “não deve ser reduzida às iniciativas de cooperação no domínio da saúde, muito menos às tratativas para potencial desenvolvimento do spray nasal”.
O órgão diz que o medicamento foi objeto de apenas uma “entre várias reuniões” feitas na viagem.
A bancada do PSOL perguntou o que levou ao Brasil mandar uma comitiva a Israel em vez de realizar reuniões virtuais, uma vez que a viagem se deu em um momento grave da pandemia.
Em resposta, o Itamaraty afirmou que a viagem foi uma oportunidade de se conhecer no local os “notáveis resultados obtidos por Israel no combate à pandemia” e afirmou que há urgência de se “colher frutos”, principalmente na área de saúde, da parceria entre Brasil e Israel “forjada no mais alto nível” a partir do governo Bolsonaro.
Foi nessa viagem a Israel que o ex-ministro Ernesto Araújo foi repreendido por não usar máscara. Sobre o assunto, o Itamaraty afirmou que o episódio não representou “constrangimento”.
“A delegação fez uso dos equipamentos de proteção individual apropriados. O então ministro [Ernesto Araújo] utilizou máscara ao longo da visita, tendo-a retirado para fazer uso da palavra em evento oficial. Foi recordado da necessidade de recolocar a máscara, o que não representou ‘constrangimento'”, diz o documento.
Em solo brasileiro, antes do embarque, a comitiva posou para fotos ao lado do presidente Jair Bolsonaro sem máscara. No desembarque, em Israel, todos usavam a proteção.
G1

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