MPF diz que Odebrecht tinha ‘estrutura profissional’ de propinas

Publicado em 24 de março de 2016

A força-tarefa da Lava Jato afirmou nesta terça-feira (22) que a Odebrecht, uma das empresas investigadas na operação, tinha uma estrutura profissional de pagamento de propina em dinheiro no Brasil. A empresa, ainda conforme a investigação, tinha funcionários dedicados a uma espécie de contabilidade paralela que visava pagamentos ilícitos. A área era chamada de “Setor de Operações Estruturadas”.
O Ministério Público Federal (MPF) afirma que os pagamentos feitos pela Odebrecht estão atrelados a diversas obras e serviços federais e também a governos estaduais e municipais. Dentre elas está a construção da Arena Corinthians, segundo o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima.
A estimativa é de, ao menos, R$ 66 milhões em propina distribuída entre 25 a 30 pessoas. Este valor, segundo a Polícia Federal (PF), estava disponível em apenas uma das contas identificada como pertecente à contabilidade paralela da empresa.

“Se chegou a observar R$ 9 milhões de um dia para outro em dinheiro em espécie”, disse a procuradora do Ministério Público Federal (MPF) Laura Gonçalves Tesser. Os pagamentos ilegais ocorreram já com mais de um ano da Lava Jato em curso.
A Odebrecht, uma das maiores empreiteiras do país, foi alvo da 26ª fase da Lava Jato, chamda de Xepa, nesta terça-feira. Por meio de nota, a empresa afirmou que tem prestado todo o auxílio nas investigações em curso, colaborando com os esclarecimentos necessários. (Veja a nota completa mais abaixo)

As primeiras ações investigativas contra a empresa ocorreram em junho de 2015, em meio à 14ª fase. De acordo com os investigadores, as vantagens indevidas se estenderam até, pelo menos, novembro de 2015, conforme comprovado por troca de e-mails entre os suspeitos.
“O que chega, para nós, a ser, de certa forma, assustador: com a efetivação da prisão de Marcelo Odebrecht, houve a ousadia de continuar a operar o pagamento de propina em detrimento do poder público”, afirma Laura Gonçalves Tesser.

Existia, segundo os investigadores, uma área especializadas para pagamentos ilícitos que operou na empresa durante seis anos. Ainda conforme a força-tarefa, a atuação se encerrou no final do primeiro semestre de 2015.
Ex-executivos e o presidente afastado da holding Odebrecht S.A, Marcelo Odebrecht, são réus em uma ação penal na Justiça Federal no âmbito da Lava Jato.

Em outro processo, por exemplo, Marcelo Odebrecht foi condenado a 19 anos e quatro meses de prisão.

Sobre estas novas suspeitas, a polícia fala em envolvimento direto de Marcelo Odebrecht.

“Não há qualquer dúvida da participação direta da Odebrecht”, declarou a delegada Renata Rodrigues. Ele era identificado nas planilhas de contabilidade paralela pela sigla MBO (de Marcelo Bahia Odebrecht), dizem os investigadores.
“Há referências às iniciais do nome do senhor Marcelo Odebrecht em planilhas apreendidas, tanto M.B.O, quanto D.P – diretor-presidente. As duas referências são feitas na mesma tabela, o que deixa bem claro que o coordenador daquela solicitação indevida é Marcelo Odebrecht”, explicou o MPF.
Marcelo Odebrecht e João Santana
Uma das tabelas analisadas pela força-tarefa, de acordo com os investigadores, mostra Marcelo Odebrecht como responsável por pagamento a ‘feira’- codinome identificado como de João Santana e Monica Moura, que estão presos pela Lava Jato. Conforme a tabela, existiu uma requisição de R$ 1 milhão em 13/11/2014.

Para os investigadores, o dinheiro seria para quitar compromissos financeiros referentes à campanha eleitoral de 2014. “Como provável contrapartida por contratos obtidos no âmbito da Petrobras”, acrescentam.

Durante a 23ª fase da operação, o marqueteiro João Santa e a mulher dele, Monica Moura, foram detidos suspeitos de receberam valores da Odebrecht no exterior e também no Brasil. Seriam US$ 7,5 milhões no exterior e mais R$ 22,5 milhões no Brasil.

O Ministério Público Federal chegou a pedir uma nova prisão preventiva contra Marcelo Odebrecht. A medida, porém, foi negada pelo juiz Sérgio Moro. O magistrado afirmou que, apesar de haver novas provas e de que há indício de obustrução de investigação, a nova prisão preventiva é desnecessária.

Nabor Bulhões, advogado de Marcelo Odebrecht, entende que a força-tarefa está acusando o cliente com base em conjecturas e presunções, pois, segundo ele, não existem fatos concretos que estabeleçam a eventual participação de Marcelo em qualquer delito investigado no âmbito da Operação Lava Jato.
Também foi negado o pedido de prisão de Benedicto Barbosa da Silva Júnior, executivo da Odebrecht que foi detido temporariamente na 23ª fase.

Contabilidade paralela
De acordo com a força-tarefa, o setor da Odebrecht responsável pelas vantagens indevidas tinha um sistema informatizado próprio utilizado para armazenar os dados referentes ao processamento de pagamentos ilícitos e para permitir a comunicação reservada entre os executivos e funcionários envolvidos nas tarefas ilícitas.
Outro sistema, no qual os envolvidos usavam codinomes, permitia a comunicação secreta entre executivos, funcionários da Odebrecht e os doleiros responsáveis por movimentar os recursos irregulares.
“Ainda estamos apurando sobre a identificação dos codinomes. As identificações ocorrem por várias formas. Às vezes é preciso reanalisar o material que já foi produzido pAra que se veja a semelhança como é o caso do ‘feira’ que se fez o gotejamento com a apreensãoo de celulares”, afirma a procuradora Laura Gonçalves Tesser.

O MPF apurou que pelo menos 14 executivos de outros setores da Odebrecht, que demandavam os “pagamentos paralelos”, encaminhavam aos funcionários as solicitações de pagamentos ilícitos, de forma que a contabilidade paralela e a entrega dos valores espúrios ficassem centralizadas nessa estrutura específica.
Conforme a Lava Jato, funcionários foram transferidos para o exterior não apenas para fugir das investigações, mas também para viabilizar a continuação desse sistema ilícito.
Segundo a força-tarefa, executivos requisitavam pagamentos a codinomes e encaminhavam ao superiores, que os autorizavam. “Havia um procedimento a ser seguido para esses pagamentos paralelos”, disse a delegada Renata Rodrigues.

Ao explicar o modo operante do esquema utilizado pela Odebrecht, o delegado da Polícia Federal Márcio Adriano Anselmo afirma que entregas de dinheiro, algumas no valor de R$ 1 milhão, eram feitas em flats.

Delação de funcionária
De acordo com o Ministério Público Federal, em março deste ano, a então funcionária da Odebrecht Maria Lúcia Guimarães Tavares, presa na 23ª fase da Operação Lava Jato, firmou acordo de delação premiada. A colaboração já foi homologada.
sso significa que ela aceitou passar informações à investigação em troca de benefícios em caso de condenação judicial.
Segundo as investigações, Maria Lúcia gerenciava a contabilidade paralela da Odebrecht, destinada ao pagamento de propina. Ela atuava como secretária dos executivos da empresa.

A Polícia Federal sustenta que a funcionária era responsável pela entrega de “vultosos recursos em espécie, utilizando, em linguagem cifrada, o termo acarajés”. Acarajé era o termo utilizado por investigados para mencionar “recurso financeiro em espécie”.

“As declarações prestadas por Maria Lúcia no âmbito do acordo não só corroboram as conclusões das Autoridades Policiais, extraídas da análise do material apreendido, mas também trazem fatos inéditos e que configuram, em tese, novos ilícitos penais perpetrados pela organização criminosa gerida no âmbito do grupo Odebrecht”, afirma o MPF.
Maria Lucia revelou que o Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht utilizava “prestadores de serviços” para disponibilizar dinheiro em espécie, que era direcionado aos fbeneficiários finais.

Combate à corrupção
O procurador Carlos Fernando dos Santos Lima destacou que o foco da Lava Jato é Petrobras, contudo enfatizou que os trabalhos contra corrupção vão continuar independente da área e de partidos políticos.
“Claro que a Lava Jato tem um foco básico na Petrobras. Entretanto, ela está no combate à corrupção. “Tendo provas de corrupção, seja qual for a empresa, seja qual for o partido, seja qual for o partido, nós vamos dar encaminhamento às investigações”, disse.

O procurador acrescentou que a força-tarefa vai colaborar com todas as investigações federais estaduais, por todo o Brasil. Segundo Lima, aquilo que não diz respeito à Petrobras será encaminhado às autoridades competentes.

Nota da Odebrecht
“A Odebrecht confirma que a Polícia Federal cumpriu hoje mandados de prisão, condução coercitiva e busca e apreensão em escritórios e residências de integrantes em algumas cidades no Brasil. A empresa tem prestado todo o auxílio nas investigações em curso, colaborando com os esclarecimentos necessários”.

Veja os nomes dos alvos da 26ª fase
Prisões preventivas
1) Hilberto Mascarenhas Alves da Silva Filho – executivo da Odebrecht, com o condinome “charlie”.
2) Luiz Eduardo da Rocha Soares (exterior) – executivo da Odebrecht.
3) Olivio Rodrigues Júnior – sócio da empresa JR Graco Assessoria e Consultoria Financeira Ltda. O nome dele constava na agenda de Maria Lucia Tavares.
4) Marcelo Rodrigues – é irmão de Olívio ligado a off-shores Klienfeld Services, utilizada pela Odebrecht para pagar propina a agentes da Petrobras.

Prisões temporárias
1) Antônio Claudio Albernaz Cordeiro – operador.
2) Antônio Pessoa de Souza Couto – subordinado a Paul Altit.
3) Isaias Ubiraci Chaves Santos – envolvido na confecção das planilhas e das requisições de pagamentos.
4) João Alberto Lovera – executivo da Odebrecht Realizações Imobiliárias.
5) Paul Elie Altit – chefe da Odebrecht Realizações Imobiliárias.
6) Roberto Prisco Paraíso Ramos – chefe da Odebrecht Óleo e Gás.
7) Rodrigo Costa Melo – subordinado a Paul Altit.
8) Sergio Luiz Neves – diretor superintendente da Odebrecht subordinado a Benedicto Barbosa Júnior é o chefe da Odebrecht Infraestrutura.
9) Alvaro José Galliez Novis – diretor da Hoya Corretora de Valores e Câmbio Ltda. Responsável pela entrega do dinheiro no Rio de Janeiro e São Paulo.
Conduções coercitivas
1) André Agostini Moreno -consultor do Governo de Santa Catarina com codinome “galego”.
2) André Luiz de Oliveira – entregador de dinheiro no codinome “timão”. Ele é dirigente do Corinthians.
3) Antonio Carlos Vieira da Silva Júnior – diretor superintendente da empresa Arcos Comunicação Ltda.
4) Bruno Martins Gonçalves Ferreira – entregador de valores no codinome “coxa”. Ligado à empresa Sotaque Publicidade e Propaganda.
5) Douglas Franzoni Rodrigues – entregador de valores com o codinome “las vegas”. Segundo a polícia, Douglas Rodrigues assumiu cargos comissionados na Cavail federal em 2005 e no Ministério de Minas e Energia em 2008.
6) Elisabeth Maria de Souza Oliveira – entregadora de dinheiro com conimode “grisalhão”.
7) Flavio Lucio Magalhães -entregador de dinheiro com condinome “formulaK.” Chegou a ser detido na 14ª fase da Lava Jato.
8) Gustavo Falcão Soares -entregador de valores. A polícia acredita que ele pode ser irmão do operador Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano.
9) Lourival Ferreira Nery Júnior – entregador de valores com o codinome “pequi”. Ele é ex-
diretor financeiro da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU).
10) Luiz Appolonio Neto – enrtegador de valores no codinome “professor”.
11) Luiz Roque Silva Alves – entregador de valores, possivelmente ligado à Odebrecht.
12) Maiara Prado Ribeiro do Lavor – entregadora de valores no codinome “amiga”.
13) Rogério Martins – entregador de valores nos codinomes “baixinhos”, “jacaré” ou “chapa”
14) William Ali Chaim – pessoa indicada como entregadora para o codinome “feira” (referente a João Santana e Monica Moura. Ele também foi tesoureiro de campanha de Rui Falcão, atual presidente do PT, e José Dirceu.
15) Alexandre Biselli – funcionário da Odebrecht responsável, em algum grau,
pelo pagamento de recursos em espécie.
16) Alyne Nascimento Borazo – funcionário da Odebrecht responsável, em algum grau, pelo pagamento de recursos em espécie.
17) Antônio Carlos Daiha Blando – funcionário da Odebrecht responsável, em algum grau, pelo pagamento de recursos em espécie.
18) Antônio Roberto Gavioli – funcionário da Odebrecht responsável, em algum grau, pelo pagamento de recursos em espécie.
19) Carlos José Vieira Machado da Cunha – funcionário da Odebrecht responsável, em algum grau, pelo pagamento de recursos em espécie.
20) Claudio Melo Filho – funcionário da Odebrecht responsável, em algum grau, pelo pagamento de recursos em espécie.
21) Eduardo José Mortani Barbosa – funcionário da Odebrecht responsável, em algum grau, pelo pagamento de recursos em espécie.
22) Fabio Andreani Gandolfo – funcionário da Odebrecht responsável, em algum grau, pelo pagamento de recursos em espécie.
23) Fernando Luiz Ayres da Cunha Santos Reis – funcionário da Odebrecht responsável, em algum grau, pelo pagamento de recursos em espécie.
24) Flavio Bento de Faria – funcionário da Odebrecht responsável, em algum grau, pelo pagamento de recursos em espécie.
25) Nilton Coelho de Andrade Júnior – entregador de valores nos codinomes “varejão” e “encostado 2”, também funcionário da Odebrecht.
26) Marcelo Marques Casimiro – entregador de valores no codinome “cobra”.
27) Camillo Gornati – envolvido na instalação do sistema Drousys, utilizado para a comunicação dos envolvidos.
28) Paulo Sergio da Rocha Soares – envolvido na instalação do sistema Drousys, utilizado para a comunicação dos envolvidos.

Os presos serão levados para Curitiba ainda nesta terça-feira, de acordo com a Polícia Federal (PF).
Defesa dos alvos da 26ª fase:
A Odebrecht informou, em nota, que “a empresa tem prestado todo o auxílio nas investigações em curso, colaborando com os esclarecimentos necessários”.
A reportagem entrou em contato com o escritório de advocacia que representa o engenheiro Antônio Claudio Albernaz Cordeiro. O advogado do empresário, Alexandre Wunderlich, disse que não teve acesso aos autos do processo e, por isso, só irá se manifestar na quarta-feira (23).
O G1 ainda tenta contato com a defesa de Antônio Pessoa de Souza Couto, subordinado a Paul Altit.
Hilbertho Evangelista, advogado do empresário Lourival Ferreira Nery Júnior, que teve a condução coercitiva decretada, disse que seu cliente não foi indiciado e nem é investigado na Operação Lava Jato. Segundo ele, Lourival apenas foi citado em conversas interceptadas pela Polícia Federal durante as investigações. “O nome do meu cliente foi apenas citado em algumas conversas interceptadas pela Polícia Federal. Durante o depoimento, o delegado fez perguntas relacionadas a 15 pessoas ligadas ao Grupo Odebrecht e indagou se ele conhecia alguma delas. Ele negou envolvimento com os citados e falou que era inocente”, disse o advogado.
O G1 tentou entrar em contato com Luiz Appolonio Neto mas, até o fechamento desta reportagem, ele não foi localizado.
Por telefone, o G1 manteve contato no início da tarde desta terça com Luiz Roque Silva Alves, alvo de um mandado de condução coercitiva. Ele é apontado como recebedor de valores, possivelmente ligado à Odebrecht. Por questões pessoais, ele disse que não poderia comentar o caso no momento e destacou que irá atender a reportagem em outra oportunidade, que não foi especificada.
O G1 ainda tenta localizar as defesas dos demais envolvidos nesta fase da operação.
G1

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