Nova fase da Lava Jato mira investigados no mensalão do PT

Publicado em 3 de abril de 2016

As investigações da Operação Lava Jato sobre o escândalo do petrolão levaram a Polícia Federal e o Ministério Público a personagens de outro escândalo: o mensalão do PT.
Um foi preso e outro levado para prestar depoimento nesta sexta-feira (1) em mais uma fase da Lava Jato, a Operação Carbono 14. É o nome do método científico usado para estimar, por exemplo, a antiguidade de um fóssil. O Ministério Público usou a expressão numa referência à investigação de fatos antigos.
Policiais federais cumpriram 12 mandados nas cidades de São Paulo, Carapicuíba, Osasco e Santo André.

O empresário Ronan Maria Pinto, dono do diário do Grande ABC, e o ex-secretário geral do PTSílvio Pereira foram presos e levados para Curitiba. Trata-se de prisão temporária, aquela que dura até cinco dias.

O ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares foi levado para prestar depoimento em São Paulo por meio de um mandado de condução coercitiva. Também foi expedido mandado de condução coercitiva para Breno Altmann, um jornalista que escreve para um blog que defende o governo na internet e que é próximo a José Dirceu. A polícia não encontrou Breno Altmann em casa em São Paulo e ele prestou depoimento em Brasília.

As prisões feitas nesta sexta-feira (1º) estão relacionadas à 21ª fase da Lava Jato, quando foi preso o pecuarista José Carlos Bumlai, amigo pessoal do ex-presidente Lula. Bumlai disse em depoimento que pegou um empréstimo de R$ 12 milhões com o banco Schahin em 2004 a pedido do PT.

O delator e um dos acionistas do banco, Salim Schahin, confirmou a versão. E disse que Delúbio Soares e o ex-ministro José Dirceu, preso na Lava Jato, participaram diretamente da concessão do empréstimo.

Afirmou ainda que o empréstimo foi várias vezes refinanciado e que a dívida só foi dada como quitada em 2009, depois que o grupo Schahin passou a operar a sonda Vitória 10 mil da Petrobras.

As investigações apuram o destino dos R$ 12 milhões do empréstimo feito por Bumlai. Eles foram remetidos diretamente para o frigorífico Bertin.

“Seis milhões de reais, segundo o depoimento do senhor José Carlos Bumlai, teria sido destinado a saldar dívidas da campanha do município de Campinas, da época de 2002, 2004. Estes fatos ainda estão em investigação”, diz o procurador da República Diogo Castor de Mattos.

Os outros R$ 6 milhões são o alvo da operação desta sexta-feira. Os investigadores dizem que o frigorífico Bertin depositou esse valor para a empresa Remar Agenciamento. A Remar fez quase todo o dinheiro chegar até empresas de Ronan Maria Pinto. A maior parte foi para a Expresso Santo André.

Ronan Maria Pinto é um empresário do setor de transportes de Santo André, no ABC Paulista.
No ano passado, foi condenado à prisão por ter participado de um esquema de corrupção no setor de transportes na prefeitura da cidade.

O juiz Sérgio Moro afirmou que “chama a atenção o malabarismo financeiro para viabilizar a transação, tendo o valor transferido do banco Schahin para Ronan Maria Pinto passado por três intermediários. Junte-se a elaboração de contratos fraudulentos de empréstimo para ocultar a operação, um deles com utilização da empresa 2 S Participações, controlada pelo condenado criminalmente como operador do Partido dos Trabalhadores, Marcos Valério Fernandes de Souza”.

Os procuradores da Lava Jato querem saber por que Ronan recebeu os R$ 6 milhões.

“A razão pela qual ele recebeu esses valores é a grande pergunta que a investigação pretende responder. Ele em princípio não é uma pessoa que está ligada a campanhas políticas, não é um marqueteiro”, afirma o procurador Diogo Castor

O juiz Sérgio Moro lembrou o depoimento de Marcos Valério, em 2012, que declarou uma possível motivação de que indivíduos do Partido dos Trabalhadores estariam sendo vítimas de “extorsão” da parte de Ronan Maria Pinto.
Citou expressamente como envolvidos Sílvio José Pereira, José Dirceu de Oliveira e Silva, Gilberto Carvalho, Luiz Inácio Lula da Silva e Breno Altmann.

Segundo Moro, é possível que o esquema criminoso de Ronan em Santo André tenha alguma relação com o homicídio, em janeiro de 2002, do então prefeito da cidade, Celso Daniel.

Os investigadores também analisam a participação do jornalista Breno Altmann nas negociações para o repasse de dinheiro a Ronan Maria Pinto.

“O senhor Breno também foi citado pelo senhor Marcos Valério como ponte de ligação entre o Partido dos Trabalhadores e o senhor Ronan Maria Pinto. O senhor Breno tem uma ligação próxima com o partido até os dias atuais. Ele volta a aparecer na Lava Jato no episódio do pagamento da multa do senhor Enivaldo Quadrado no mensalão. A Meiri Bonfim havia dado uma declaração no sentido de que o senhor Enivaldo teria a sua multa de mensalão paga pelo Partido dos Trabalhadores. E a razão do pagamento desta multa pelo partido é justamente o contrato envolvendo os fatos do dia de hoje que o senhor Enivaldo tinha em seu poder e o pagamento da multa estava sendo feito pelo senhor Breno Altmann”, explica o procurador.

No despacho, o juiz Sérgio Moro também fala do papel do jornalista, afirmando que “Breno Altmann é indicado por Marcos Valério como pessoa envolvida no aludido repasse de valores a Ronan Maria Pinto, motivo pelo qual justifica-se a necessidade de ouvi-lo”.

Além de Marcos Valério, a operação desta sexta-feira trouxe de volta outros condenados no mensalão do PT. E mais uma vez ligados a desvio de dinheiro público. O ex-secretário geral do partido Silvio Pereira e o ex-tesoureiro Delúbio Soares. Os procuradores veem pontos em comum entre a Lava Jato e o mensalão.

“Há algumas peculiaridades dessa fase que envolvem uma tipologia semelhante à adotada no mensalão pelo uso de uma instituição financeira de um empréstimo fraudulento. Enquanto no mensalão o pagamento desses empréstimos fraudulentos era feito mediante favores do governo federal, no caso presente o favorecimento, o favor para o pagamento desse empréstimo foi a utilização de um contrato bilionário com a Petrobras”, explica o procurador.
Em texto publicado na internet, Breno Altmann critica o fato de ter sido chamado a depor por meio de mandado de condução coercitiva, dizendo que jamais tinha recebido convocação prévia para depor. Altmann afirma que durante seu interrogatório não foi apresentada qualquer prova de seu envolvimento no suposto empréstimo a Ronan Maria Pinto. Ele criticou o juiz Moro e os procuradores da Lava Jato, pelo que chamou de atropelo das garantias constitucionais.
A assessoria de Ronan Maria Pinto disse que ele negou ter recebido os R$ 6 milhões e que ele sempre se colocou à disposição da Justiça. A assessoria afirmou ainda que, nos processos de corrupção aos que Ronan ainda responde, só há uma condenação em primeira instância, em fase de recurso, e que nenhum processo judicial envolveu o nome de Ronan Maria Pinto em fatos sobre a morte do prefeito Celso Daniel.
O Partido dos Trabalhadores afirmou que nunca contraiu empréstimo com o banco Schahin e que todas as doações recebidas foram legais e declaradas à Justiça Eleitoral.
O Instituto Lula afirmou que a reabertura de um caso encerrado em todas as instâncias judiciais, a partir do que chama de ilações sem fundamento, é mais uma arbitrariedade cometida pelo juiz Sérgio Moro contra Lula e que ao continuar, no que o instituto classifica como uma perseguição política e pessoal, o juiz e a força-tarefa afrontam a Suprema Corte e os direitos de Lula.
Em outra nota, os advogados de Lula dizem que ele sempre agiu dentro da legalidade, que não há motivo que pudesse justificar uma tentativa de extorsão ao ex-presidente e que as autoridades que analisaram o caso não identificaram qualquer elemento que pudesse conferir veracidade às declarações de Marcos Valério.
A defesa de Marcos Valério afirmou que todas as pessoas mencionadas nesta fase da Operação Lava Jato já haviam sido citadas por ele em 2012, no depoimento à Procuradoria Geral da República, e que tudo foi confirmado agora.
Gilberto Carvalho afirmou que não participou de nenhuma negociação com Ronan Maria Pinto e que o PT sempre pediu a elucidação dos fatos ligados à morte do prefeito Celso Daniel. Gilberto Carvalho disse ainda ter todo o interesse em que as investigações sejam realizadas com objetividade e sem uso político.
O Jornal Nacional não conseguiu contato com as defesas de Enivaldo Quadrado, José Dirceu, do grupo Bertin e da Remar Agenciamento.
As defesas do grupo Schahin, de Salim Schahin e de José Carlos Bumlai não quiseram se manifestar.
G1

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