Em vídeo, agente da PRF ensina alunos como torturar um preso usando gás de pimenta. Depois diz que “foi brincadeira”. Veja

Publicado em 28 de maio de 2022

Um dos representantes do movimento de policiais influenciadores que se disseminou nas redes sociais, o agente da Polícia Rodoviária Federal (PRF) Ronaldo Bandeira viralizou nas redes nesta sexta-feira, 27. Num vídeo ele aparece dando aula num cursinho para policiais ensinando como teria torturado um preso na viatura policial usando gás de pimenta. O método que Bandeira relata em tom jocoso é semelhante ao que levou à morte Genivaldo de Jesus Santos, em Umbaúba, no sul de Sergipe: a aplicação de spray de pimenta no porta-malas da viatura, fazendo do local uma câmara de gás improvisada.
“Ele (suspeito) tentou quebrar o vidro da viatura com um chute, ficou batendo o tempo todo. O que o polícia (sic) faz? Abre um pouquinho (o porta-malas), pega o spray de pimenta e ataca. F…! É bom para c… A pessoa fica mansinha”, disse Bandeira aos risos. “Daqui a pouco eu só escutei assim: ‘eu vou morrer’. Aí eu fiquei com pena, cara. Eu abri assim e disse: ‘tortura’! E fechei de novo”, completou, arrancando risadas da plateia de candidatos a policiais.
Ciente de que a aula estava sendo gravada, Bandeira chega a afastar o microfone do rosto antes de relatar a prática de tortura, com a pretensão de que somente os alunos ouvissem o relato. Ao final do vídeo, o agente rodoviário diz se tratar de uma brincadeira e afirma não ter feito isso, pois sofreria procedimentos disciplinares.
Questionado pela reportagem, Bandeira disse que o vídeo foi “pinçado e recortado”. O policial rodoviário afirmou ao Estadão que as declarações dadas durante a aula foram um “exemplo lúdico” sobre o que não deve ser feito durante o exercício da função. Segundo ele, a encenação da tortura, aos risos, foi uma brincadeira.
“Quero deixar claro que eu não corroboro com nenhuma prática de tortura e nunca pratiquei. Aquilo ali é um exemplo fictício. Tem seis anos aquele vídeo. Esse vídeo foi resgatado, pinçado e recortado. No final do vídeo, eu deixo claro que se trata de uma brincadeira. Foi um exemplo acerca da própria lei 455 (tipifica o crime de tortura). Um exemplo infeliz ali no momento. Não corroboro, não pratico e nunca vi um ato desses na PRF”, afirmou Bandeira ao Estadão.
Quando perguntado sobre o caso de Sergipe, Bandeira disse não poder se manifestar, em nome da PRF, sobre o assassinato de Genivaldo de Jesus por colegas de corporação. O policial também não comentou a semelhança entre os métodos aplicados pelos agentes e os ensinados por ele aos seus alunos no curso preparatório.
“A gente, na sala de aula, traz casos para fazer o aluno entender, de tal forma que o aluno traga o exemplo fictício para a vida real. A gente usa esses exemplos elucidativos em uma turma de carreira policial, que infelizmente pode se deparar com essas situações dessas, que não devem ser praticadas e que ele pode ser responsabilizado por isso”, disse.
Com 20,9 mil seguidores no Facebook e outros 13,4 mil no Instagram, Bandeira se comporta como celebridade e foca em produzir conteúdos motivacionais que levem o público das suas redes sociais a se inscrever nos cursos preparatórios oferecidos por ele para aprovação nos concursos da PRF. O pacote com as aulas é vendido por R$ 899 em um site com o nome do agente, que também é o dono da RBCarreiras. Ao Estadão, ele descreveu a empresa como “um curso preparatório para concursos públicos voltados para carreiras policiais”.
No Youtube, Bandeira publica vídeos em dois canais: o RB Carreiras Policiais, com 56,3 mil inscritos, e o Embaixador do CTB, com apenas 75 inscrições. O primeiro canal é utilizado para publicar conteúdos selecionados dos cursos preparatórios, com publicações que abarcam desde aulas de língua portuguesa até a análise da proposta do presidente Jair Bolsonaro (PL) de reestruturação da PRF. “Eu tento trazer educação e conhecimento para o público em geral”, disse ao Estadão.
Na conta de menor alcance, que conta com apenas dois vídeos, Bandeira fez uma publicação intitulada “Como é ser um PRF?”, com explicações sobre a vida de policial rodoviário. Em tom informal, o agente come pão com mortadela e entretém o público com comentários sobre sua dieta, o uso confesso de anabolizantes com acompanhamento médico, a rotina na instituição e os motivos para não consumir bebidas alcoólicas.
“Eu queria um trabalho mais ameno, que eu tenha autonomia, tempo livre para fazer outras coisas que eu queria e que tenha um salário razoável, então optei pela Polícia Rodoviária Federal. E também porque eu amo, sempre tive esse sangue policial”, disse Bandeira no vídeo.
Bandeira explica ter se dedicado à carreira de policial rodoviário porque, na época em que prestou o concurso, a corporação oferecia salários mais atrativos do que as Forças Armadas. Às 300 pessoas que assistiram ao vídeo, o agente disse amar o que faz, mas também faz críticas sutis à PRF, como o desejo que a instituição aumentasse o efetivo.
Procurado pela reportagem, o Ministério da Justiça e Segurança Pública disse que a avaliação do comportamento do agente é responsabilidade da Polícia Rodoviária Federal. A Corporação não respondeu ao contato do jornal até a publicação deste texto.

Foto: Reprodução/Twitter / Estadão
Terra

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